Ernesto, 87 anos, velho carismático, língua afiada, bem
humorado, descarado, morrendo de cirrose hepática. Ele estava deitado na cama
de sua casa quando pediu que seus netos entrassem. Eram cinco. Luis de 23 anos,
Débora de 20 anos, Kaik de 18 anos, Luíza de 15 anos e Rafael de 3 anos.
- Queridos netinhos, o negócio é o seguinte. O vovô tá indo
pra highway to hell e como ama muito vocês tem alguns conselhos pra dar. Eu
nunca fui muito certo da cabeça e aconselho vocês a fazerem o mesmo. E como eu
bem sei que muitos de vocês herdaram meu sangue de porra louca, aqui vão alguns
conselhos: façam da vida de vocês o que quiserem. Se alguém falar o contrário
concorda na hora, vira as costas e faz o que quiser. Se for uma coisa muito
brava pode até mandar ir pro inferno em silêncio, um dia você vai morrer e ninguém vai
lembrar das suas maravilhosas palavras de afeto. Só vocês sabem o que é bom pra
vocês. Ou não. Mas em algum momento vocês vão ver qual das opções é a certa. Eu
vi quando conheci sua vó. A melhor coisa da minha vida foi ter dado um jeito de
amarrar sua vó em mim e deixar ela aqui comigo até hoje. Ela vale mais pra mim
do que tudo no mundo, do que cada gota de álcool que hoje mata meu fígado e
várias outras merdas que já estiveram em mim. Sua vó é foda! Ela é boa em tudo,
e em coisas que vocês não precisam saber também. Quando eu tiver mortinho, se
segura nela. Só pra finalizar a parte dos "conselhinhos" de velho gagá, Kaik, vodka
é coisa de viado. Se você quer beber, pega a chave embaixo do vaso na porta de
entrada e abre aquele porão que fica escondido debaixo da grama lá no fundo.
Vasculha aquilo ali e vê se vira homem.
Rafael dava gargalhadas no chão.
- Passemos pra mim agora, o astro dos últimos dias. Eu quero
que vocês me enterrem nu. Assim ninguém vai querer ficar naquela bosta de
velório por muito tempo e acaba rápido com essa babaquice. E outra, me enterrem com
muitos, mas muitos cogumelos, não sei como vai ser essa viagem pro além, vai
que eu preciso. E, o mais importante, cuidem da sua vó. Débora e Luíza,
certifiquem-se de que vocês serão companheiras tão maravilhosas como ela foi
pra mim. Cacete, eu amo sua vó. – ele suspirou longamente – É isso, crianças.
Agora vão embora porque eu preciso peidar e ultimamente isso tem fedido como o
inferno. Puta que pariu, eu tô podre.
Ernesto morreu oito dias depois. Foi enterrado com seu
melhor terno azul marinho e rosas brancas. Ninguém entendia porquê seus netos
riam tanto no gramado ao lado.
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