"Comece pelo começo - respondeu o Rei, muito sério - E vá até o fim. Quando terminar, pare." (Alice no País das Maravilhas - Lewis Carroll)

sábado, 4 de janeiro de 2014

Sobre coisas que não dá pra falar.

Estava no meio da tarde quando R... teve seu sonho interrompido pelo entregador de cartas batendo à porta. Era uma caixinha que fazia barulho quando chacoalhada, não havia remetente somente seu nome lá em letras de forma como destinatário. Sentou-se no sofá onde dormia, tomou longos goles d'água, bocejou e abriu o pacote. Eram vários cartões postais, muitos mesmo, de vários lugares ao redor de todo o mundo. No verso de cada um havia passagens do tipo "Aqui nós iríamos montar uma casa e deixá-la.", "Aqui finalmente aprenderíamos a dançar tango.", "Aqui viríamos nadar escondidos nas cachoeiras"... Logo ele pensou, não pode ser, o que ela quer agora? No fundo da caixa, debaixo de todos os postais havia uma carta, extensa, ele notou. Levantou-se em direção à janela e começou a ler:
 

"Querido R..., ou, se ainda posso te chamar assim, 'meu menino'
 

Eu sei que eu desapareci de repente e agora reapareço em outro repente. Você não deve ter entendido, eu calculo... Você já não entendia há tempo... Era bom estar com você, sempre foi. Nós funcionávamos muito bem, nós dois. E é isso, nós dois. Engraçado, você lembra que demorou um dia pra notar que eu havia partido? Você estava fazendo não sei o quê com não sei quem não sei onde e nem notou, só no outro dia que foi sentir minha falta, mas aí eu já havia partido para o meu primeiro país-destino e você, não me surpreendi, nada fez. Já se passou dois anos, não sei o que foi feito da sua vida, você provavelmente não quer saber o que eu fiz da minha mas mesmo assim eu vou contar, e, como nos velhos tempos, você vai 'ouvir' e logo esquecer. Mas vamos lá, já tenho lápis, papel e um monte de letras...
Nós ficamos juntos por cinco anos. Cinco anos mágicos, eu posso dizer. Gente para falar que nós não iríamos durar era o que mais tinha, mas aí TAF, demos um tapa na cara da hipocrisia alheia. Desde o começo sabíamos que não éramos iguais e optamos por nos moldar um pelo outro, o que deu bem certo. Como deu! Conhecemos lugares incríveis, tivemos neles noites mais incríveis ainda, onde eram o céu, você e eu. E nós não precisávamos mesmo de mais nada... Mas não era da sua natureza criar amarras. Você precisava ser livre e eu precisava que você fosse feliz. E então eu vi que quem deveria partir era eu. Afinal, você precisava ser livre  e eu precisava que você fosse feliz. Depois de noites seguidas dormindo envolvida no meu pranto e você vivendo como se estivesse tudo bem, meu cérebro doía. Eu nunca tive sentimentos maus por você a esse respeito, ao invés de te lançar raiva, eu me lançava mágoa. Foi então que eu percebi que eu amava o 'meu' R..., e não qualquer outro R... que você podia ser. Era quase um amor platônico. E então eu parti. Parti, mas não te deixei. Todo esse tempo eu tenho visitado os lugares que planejamos conhecer e em cada um deles lembro de você com todo o carinho que tenho, afinal, eu te amo. Eu sabia que de alguma forma esses postais chegariam até você, só não tinha decidido como. Não estou voltando e nem pretendo. Se quiser se encontrar comigo, você vai saber onde me achar. Minha peregrinação acabou. Vou me afixar nesse lugar que você está pensando agora, se já não tiver esquecido. Enfim, é isso R... Te deixei porque te amo, não te esqueci porque te amo. E te amo, te amo, te amo.
 

Da sempre sua,
 

L..."

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