Eu sou a Augusta.
Diagnosticada com transtorno bipolar com tendência ao autismo desde que posso
me recordar. Minha cabeça não é o caos, minha vida é. E o mundo. Por isso
resolvi me fechar a ele. Há algo de errado com as pessoas que eu ainda não
descobri o que é. O contato máximo que me permito ter com elas é através de um
vidro, seja ele o de uma janela, uma porta, ou uma televisão. Especialmente o
último. Contrariando todas as expectativas para uma pessoa como eu, amo cinema.
Me entrego aos filmes, histórias, lugares e personagens; porque eu sei que
estão protegidos por uma camada de filme, outra de plástico e um vidro espesso.
E eu, pelos mesmo meios, protegida deles. Só há uma pessoa que eu não quero
barrar, ele. Ele é o meu paraíso pelo simples motivo de me desligar. Quando ele
chega olhando nos meus olhos e sorrindo, o mundo para de zunir lá fora. Basta
eu me lembrar que é um olhar de pena entre médico e paciente para que aquela
parte de mim comece a gritar. Por quê? Será que ele pensa que eu sou doente?! É
assim então que ele me vê?! Ele está errado. O mundo é que é doente! E então
ele me desliga mais uma vez, mas dessa vez de verdade. Um efeito que dura
algumas horas... Depois o mundo volta a zunir, e minha cabeça tenta reorganizar
o caos. De novo, tudo igual. Até onde se possa dizer, normal. Voltamos a ser o
silêncio, os filmes e eu. Hoje pela manhã fui até a janela. Lá na rua estavam o
Doutor Coitadinha-da-minha-paciente com uma mulher. Eles estavam felizes, como
os casais protegidos pela televisão. Eu toquei o vidro da janela, agora sim eu
queria quebrar toda proteção que me separava dele, naquele momento me dei conta
da tamanha dependência que eu criara para com ele. Foi quando vi meu reflexo no
vidro. Me assustei sinceramente! Olhava para mim e via meus ossos, meus olhos
saltavam do meu rosto magro! Marilyn, a eterna senhorita Monroe, uma vez disse
que se fosse para alguém ser duas caras, que fizesse ao menos uma delas bonita.
Me desculpa, não consegui. Nenhuma delas. Em mim uma face gritava de dor e a
outra desorbitava em desespero. O que eu fiz de mim? O que eu fiz de nós? O que
o mundo causou? Eu chorei. Simplesmente. Me cedi ao chão frio e chorei...
Nenhum comentário:
Postar um comentário